POESIA MUNDIAL EM PORTUGUÊS
Foto e biografia: https://pl.wikipedia.org
TADEUSZ RÓżEWICZ
( POLÔNIA )
( 1921 – 2014)
Tadeusz Różewicz foi um poeta, dramaturgo, escritor e tradutor polonês. Różewicz estava na primeira geração de escritores poloneses nascidos depois que a Polônia recuperou sua independência em 1918, após o século das partições estrangeiras. Ele nasceu em Radomsko, perto de Łódź, em 1921
REVISTA DA ACADEMIA DE LETRAS DO BRASIL. Ano 4, jan./jun. No. 7 – jan./jun. 2022. Editor: Flavio R. Kothe. Brasília, DF: Editora Cajuína, Opção editora, 2023. 158 p. ISSN 2674-8495
TRADUÇÃO DO POLONÊS AO PORTUGUÊS
por MARCOS FREITAS
EU CHOREI
Eu chorei na noite
Os mortos mostraram-se
aos meus olhos
suavemente sorrindo
a lança da escuridão
penetrou-me
fria rígida
e abriu
minhas entranhas
POESIA SEMPRE. Ano 15 Número 30 2008. Polônia. Editor Marco Lucchesi. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 2008. 178 p. No. 10 381
Exemplar da biblioteca de ANTONIO MIRANDA
No meio da vida
Depois do fim do mundo
depois da morte
me achei no meio da vida
cariava a mim mesmo
construía a vida
gente animais paisagem
isto é uma mesa eu dizia
isto é uma mesa
sobre a mesa repousam o pão e a faca
a faca serve para cortar o pão
a gente esse alimenta de pão
é preciso amar o homem
eu aprendia de noite e de dia
o que é preciso amar
eu respondia o homem
isto é uma janela eu dizia
isto é uma janela
além da janela é o jardim
no jardim eu vejo uma macieira
a macieira floresce
caem as flores
os frutos se formam
amadurecem
meu pai colhe a maçã
aquele homem que está colhendo a maçã
é meu pai
eu ficava sentado na soleira da casa
aquela velha que
puxa um bode pele soga
é mais necessária
e mais valiosa
do que as sete maravilhas do mundo
quem pensar e sentir
que ela não é necessária
esse é um genocida
isso é um homem
isto é uma árvore isto é um pão
os homens se alimentam para viver
eu repetia a mim mesmo
a vida humana é importante
a vida humana tem um grande peso
o valor da vida
ultrapassa o valor de qualquer objeto
que o homem fez
o homem é um grande tesouro
eu repetia contumaz
isto é água eu dizia
alisava as ondas com a mão
e falava com o rio
água dizia eu
água boa
isto sou eu
o homem falava à agua
falava à lua
às flores à chuva
falava à terra
às aves
ao céu
O céu se calava
se calava a terra
se ele ouvia a voz
que subia
da terra da água e do céu
isto era a voz de outro homem
Tradução de HENRIYK SIEWIERSKI e JOSÉ SANTIAGO NAUD
(Quatro poetas poloneses. Curitiba: Secretaria de Estado da Cultura, 1994.)
Reabilitação post-mortem
Os mortos lembram-se
de nossa indiferença
os mortos lembram-se
do nosso silêncio
os mortos lembram-se
de nossas palavras
Os mortos vêm as nossas caras
distendidas de orelha a orelha
os mortos vêem os nossos
corpos que se esfregam
os mortos ouvem
o ruído de nossas línguas
os mortos lêem os nossos livros
ouvem os nossos discursos
pronunciados há muito
os mortos analisam os relatórios
participam de discussões
já encerradas
os mortos vêm as nossas mãos
prontas para aplaudir
os mortos enxergam estádios
corais conjuntos em escansão
todos os vivos são culpados
culpadas são as crianças pequenas
que entregavam buquês de flores
culpados são os amantes
culpados são
culpados são aqueles que fugiram
e aqueles que ficaram
aqueles que disseram não
e aqueles que nada falaram
os mortos estão contando os vivos
os mortos não haverão de reabilitar-nos
Tradução de ALEXANDRE JOVANOVIC (Céu vazio:
63 poetas eslavos. São Paulo: Hucitec, 1996).
Esboço para um moderno poema erótico
Entretanto a brancura
pode ser descrita melhor pelo gris
o pássaro por uma pedra
no inverno
os antigos poemas eróticos
costumavam ser descrições do corpo
descreviam isto e aquilo
por exemplo pestanas
entretanto a cor vermelha
deveria ser descrita
pelo gris o sol pela chuva
as papoulas no outono
os lábios pela noite
a mais plástica
descrição do pão
é a descrição da fome
há nela
um cerne úmido e poroso
um morno interior
girassóis na noite
os seios o ventre as coxas de Cibele
uma original
cristalina descrição
da água
é a descrição da sede
da cinza
do deserto
provoca fada-morgana
nuvens e árvores entrando
num espelho
Carência fome
ausência
do corpo
é a descrição do amor
´e um moderno poema erótico
Tradução de HENRYK SIEVIERSKI e JOSE SANTIAGO NAUD
(Quatro poetas poloneses. Curitiba: Secretaria de Estado
da Cultura, 1994.)
Minha poesia
não justifica nada
não explica nada
não renuncia a nada
não abarca o todo
não realiza a esperança
não cria novas regras de jogo
não participa da festa
tem lugar circunscrito
que precisa preencher
se não é fala esotérica
nem fala original
se não espanta
está claro que assim é preciso
é obediente à própria fatalidade
suas próprias possibilidades
e limitações
perde para si mesma
não entra em lugar de outra
nem por outra pode submeter-se
aberta para todos
desprovida de mistério
tem muitas tarefas
que nunca poderá cumprir
Tradução de HENRIK SIEWIERSKI e JOSÉ SANTIAGO NAUD.
(Quatro poetas poloneses. Curitiba: Secretaria de Estado da
Cultura, 1994.)
Entre tantas tarefas
Entretantas tarefas
tão urgentes
esqueci que
também é preciso
morrer
leviano
descuidei dessa obrigação
ou só a cumpri
negligentemente
a partir de amanhã
tudo muda
começo a morrer com cuidado
com sapiência otimismo
sem perda de tempo
Tradução inédita de MARCELO PIVA DE SOUZA (Poema original,
“Wsród wiekky zahçc’, extraído de Tadeusz Rózewicz. Poezje
wybrane, Kraków: Wydawnbuctwo Literackie, 1994.)
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Página publicada em maio de 2025.
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Página publicada em setembro de 2023
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